COMUNICAÇÃO

Reparação histórica: Rutian Pataxó é apresentada como primeira ouvidora-adjunta indígena da Defensoria da Bahia

16/06/2023 18:22 | Por Ailton Sena DRT 5417/BA

O anúncio aconteceu dentro da programação do ATL Bahia e foi celebrado por lideranças indígenas, parlamentares e representantes de diversos movimentos sociais

Com a força ancestral dos cânticos e rituais de seu povo, Rutian Pataxó adentrou o plenário do 5º Acampamento Terra Livre Bahia – ATL, ao ser anunciada como ouvidora-adjunta da Ouvidoria Cidadã da Defensoria Pública da Bahia – DPE/BA. Ela é a primeira mulher indígena a assumir o cargo para, junto a ouvidora-geral Naira Gomes, fazer ecoar nos projetos, atuações e estrutura da DPE/BA os anseios da sociedade civil e, em especial, dos povos originários.

O ingresso de Rutian na estrutura da Ouvidoria Cidadã acontece em um momento de avanços e intensificação do trabalho voltado à garantia de direitos das comunidades indígenas pela Defensoria da Bahia. E se soma às ações iniciadas em 2007, através do projeto Balcão de Direitos, e que culminaram na instalação da primeira sede com base na presença de comunidades indígenas no território. No cenário nacional, os desafios são o esvaziamento de atribuições do Ministério dos Povos Indígenas e a votação do Marco Temporal.

Para a missão que passa a assumir na Ouvidoria da DPE/BA, Rutian traz a experiência de ter sido secretária geral do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia – Mupoiba; a força e resiliência dos 30 povos indígenas existentes no estado e a união das mulheres e homens que entraram de mãos dadas com ela no plenário: a defensora-geral da Bahia, Firmiane Venâncio, Naira Gomes, a Cacica Maria Kiriri e Kãhu Pataxó. E foi justamente esse sentimento de coletividade que Rutian destacou em sua primeira fala como ouvidora-adjunta.

“É com muita alegria que chego aqui sabendo que minha caminhada foi com vocês. Eu sempre tive a companhia e parceria de todos os povos indígenas, que contribuíram com a minha formação. Esse é um momento de visibilidade para os povos indígenas e de ocupação de mais um espaço de luta para todos nós”, reforçou a ouvidora-adjunta Rutian Pataxó. A liderança destacou ainda a experiência de escuta que teve junto aos movimentos e definiu a Ouvidoria como mais uma “casa de acolhimento dos povos indígenas”.

Mulheres em luta pela transformação

A força da coletividade também deu a tônica da fala da ouvidora-geral. “Na minha experiência de vida como mulher negra de candomblé que venceu ciclos de violência, ficou claro que o amor e a coletividade salvam”, assinalou Naira Gomes. Ao agradecer Rutian por aceitar o convite para se aliar a ela na escuta e encaminhamento das demandas da sociedade civil, a ouvidora prometeu união na luta dos povos negro e indígena e anunciou: “nós faremos o que precisamos fazer: resistir, subverter, estar juntas e ter amor por nós mesmas e pela coletividade”.

Para a defensora-geral Firmiane Venâncio, que é ativista e intelectual feminista, a ocupação do cargo de ouvidora-adjunta por Rutian trata-se de um mecanismo de reparação histórica na Defensoria da Bahia. Ela, que construiu uma gestão com mais de 70% de mulheres em cargos de chefia, destacou ainda a importância da ocupação feminina nos espaços de poder com possibilidade de promover transformações estruturais.

“A Defensoria da Bahia é paradigma para as outras porque é capaz de construir momentos como esse. Capaz de realizar políticas públicas para dentro e para fora, dando exemplo de inclusão, pertencimento e participação dos povos indígenas, povo negro e população vulnerabilizada, que exercem dialogicamente o poder-dever de levar acesso à justiça para todas as pessoas de nosso estado”, enfatizou a defensora-geral.

Parafraseando Adélia Prado, Firmiane encerrou sua fala dizendo que “para o desejo do meu coração, a presença de vocês [povos indígenas] que temos hoje dentro da Defensoria da Bahia é só uma gota”. E aquela que foi a primeira gota, a defensora pública Aléssia Tuxá, lembrou seu discurso de posse, quando prometeu ser a primeira, mas não a única indígena na instituição; e expressou a felicidade em acompanhar o anúncio da ouvidora-adjunta.

Aléssia também falou sobre o trabalho que tem realizado junto ao GT de Igualdade Étnica, que desde a criação realiza visitas e articulações para garantia de direitos das comunidades indígenas do estado. “Nós apresentamos a Defensoria Pública, que é a instituição responsável por garantir o acesso à justiça aos grupos vulnerabilizados”, explicou a defensora pública, que também lembrou que o conhecimento também resultará em cobrança da instituição por representação, apoio, recebimento e encaminhamento de demandas.

O evento de apresentação de Rutian Pataxó como ouvidora-adjunta também contou com falas da secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, Fabya Reis; da deputada Olívia Santana; da co-coordenadora do Mupoiba, Patrícia Pararé; e do Cacique Babau, que pediu visibilidade e inclusão dos povos ciganos nos espaços de luta. Também prestigiaram o evento representantes das ouvidorias das secretarias de estado e diversas lideranças indígenas.

Currículo da ouvidora-adjunta

Indígena do povo Pataxó, Rutian é graduada em Direito e Ciências Econômicas pela Universidade Federal da Bahia e especialista em Direitos Humanos e Contemporaneidade pela mesma instituição. Desenvolveu pesquisa sobre a Organização social, política e produtiva dos Tupinambá da Serra do Padeiro (Terra Indígena Tupinambá de Olivença, Bahia).

Foi pesquisadora colaboradora do Programa de Educação Tutorial (PET Comunidades Indígenas) UFBA e como colaboradora do projeto “Cunhataí Ikhã” (meninas de luta) entre a Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí) e o Fundo Malala, que visa à melhoria da educação para as meninas indígenas da Bahia. Além disso, foi secretária geral do Mopuiba.

Confira as fotos do evento no Flickr da Defensoria.