COMUNICAÇÃO

Itinerância em Araci: Adequações de nome e de gênero para pessoas trans são destaques em passagem da Unidade Móvel

04/12/2023 16:56 | Por Tunísia Cores - DRT/BA 5496

Atendimento itinerante registrou 60 atendimentos com a UMA

“Olha aí o projeto que vem para Araci. Veja se oferece o que você quer: trocar seu nome”, dizia a mensagem recebida por Jan Carvalho da Silva, há alguns dias, em seu celular. Era o link do documentário “Onde é que a gente estava? UMA: a chegada da Esperança”, produzido pela Defensoria Pública da Bahia para relatar as transformações promovidas nos municípios devido à passagem da Unidade Móvel de Atendimento, a UMA, da DPE/BA. O equipamento esteve em Araci em 30 de novembro, na praça da Nação.

“Assisti para ver se realmente a Defensoria fazia o que eu tanto queria. Perguntei a minha mãe o dia [em que a UMA estaria na cidade], conversei com a minha patroa, que me liberou porque sabe o quanto é importante para mim e, agora, estou aqui”, disse Jan na última quinta-feira. Ela foi à Unidade Móvel para mudar seu nome de registro, Janaína, pois não se identifica com ele.

A busca pela mudança do nome começou no segundo semestre de 2022, a partir da Nova Lei de Registros Públicos (Lei n. 14.382/22), que permitiu às pessoas maiores de 18 anos a alteração do nome independentemente de decisão judicial. Munida da lei em mãos, a jovem se dirigiu ao cartório e solicitou pessoalmente a mudança. Como resposta, ouviu, no local, que a referida lei não existia. “Eu me senti constrangida, fui embora”, disse.

Por isso, não perdeu tempo na última quinta-feira (30) e compareceu à praça da Nação para dar início ao procedimento com o auxílio da DPE/BA. “Eu espero que meus colegas e minhas colegas venham porque eu postei o vídeo [documentário] em minhas redes e quero que aproveitem essa oportunidade maravilhosa. Estou desde o ano passado tentando e, nessa caravana maravilhosa, com certeza eu vou conseguir, tudo está sendo encaminhado”, disse Jan, animada, aproveitando para agradecer a mãe pelo apoio e presença nesse momento importante.

O convite feito por Jan – dirigido aos seguidores, amigos e colegas – surtiu efeito: Kauany da Silva e Luísa Santos aproveitaram a ocasião para solicitar a adequação de nome e gênero especificamente para pessoas travestis e transexuais. À nossa equipe, Luísa relatou que já havia pesquisado sobre o procedimento, mas que essa foi a sua primeira tentativa de fato – e bem sucedida.

“Eu vim, consegui adiantar a minha situação e em breve vou pegar a minha certidão com o meu nome novo, tudo novo. Isso me deixa muito feliz porque eu não vou precisar me limitar. Vou chegar nos lugares e me apresentar como eu mesma”, disse com leveza e sorriso no rosto.

Além do nome, outra coisa vai mudar na vida de Luísa: a coragem para realizar os planos que tem para o futuro. “Eu vou para a faculdade, cursar o que eu quero. Eu procurava saber quais lugares aceitavam nome social para me inscrever com ele, pois não gostava de usar o meu nome morto. A partir de agora eu vou estar livre para fazer tudo o que eu quero”, disse a jovem.

Jan Carvalho e a Luísa Santos foram atendidas pela defensora pública Rayanne Bezerra, que participou das itinerâncias em Araci e também em Crisópolis. Rayanne Bezerra disse que, em ambos os casos, foram encaminhados ofícios para o Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais de Araci sinalizando as demandas das duas usuárias.

“No caso de Luísa, mulher trans, também foi elaborada uma declaração para confirmar o seu desejo de adequação de nome e gênero. Ter acesso aos nossos serviços foi muito importante para as meninas, principalmente para Luísa, pois ela narrou o desejo de entrar para uma universidade e poder apresentar a sua identidade com o nome correto”, relatou a defensora pública.

Quem também buscou a adequação de nome e gênero para pessoas trans foi Andrea Luísa de Moura (33), que desejava retirar do seu registro o nome masculino e adotar oficialmente a sua identidade. Nascida em Tucano, ela veio morar em Araci com sua mãe e há cerca de 12 anos já queria fazer a adequação de nome e gênero.

“O advogado me cobrou muito caro, um salário mínimo na época. Era muito triste porque eu não tinha condições de fazer e já tinha desistido. Mas minha cunhada me ligou, disse que a Defensoria estaria aqui e poderia mudar o meu nome. Sei de muitas os que querem fazer [ a adequação], mas não estão sabendo ou têm vergonha”, disse.

O atendimento foi feito pela defensora pública Beatriz Soares. “Nós prestamos a orientação jurídica, providenciamos toda a documentação de forma gratuita para que ela possa efetivar essa adequação diretamente no cartório, de forma extrajudicial, que é um procedimento mais célere do que se precisasse de uma ação judicial”, explicou.

Primos ou irmãos?

Josefa Rodrigues, de 60 anos, estava sintonizada na rádio Cultura 104,9 FM, de Araci, quando ouviu que a Unidade Móvel estaria na cidade. De imediato, mandou uma mensagem para José Rodrigues, 60, perguntando se ele topava fazer o exame de DNA tirar a dúvida de toda uma vida: se o laço que tinham era de primos ou de irmãos. “Eu vim só para fazer esse exame, viajei umas quatro horas”, disse Josefa, que saiu de Camaçari e percorreu quase 210 km até Araci.

Na praça da Nação, ambos explicaram que são filhos da mesma mãe. Ela era casada, mas a relação acabou devido às suspeitas de que José não seria filho do casamento. Com o exame de DNA, eles buscam encerrar as dúvidas para dar lugar à certeza.

“Quero saber se o pai dela é o mesmo do meu. Uns dizem que sim, outros que não, mas o que vai nos mostrar a verdade será o exame de DNA”, disse José. Ambos seguem na expectativa do resultado do exame até a data de abertura, que deve ocorrer após cerca de 90 dias, na presença dos dois.

Coordenadora do Núcleo de Atuação Estratégica e responsável pela Unidade Móvel, a defensora pública Cristina Ulm avaliou a itinerância, que teve a adequação de nome e gênero entre os destaques.

“Conseguimos fazer muitas demandas, adequações de nome e gênero de transexuais, resolver a questão para dar dignidade a essas pessoas que passam por muitos constrangimentos por não terem suas identidades reconhecidas. E a Defensoria pôde efetivar esse direito. Então, finalizamos a itinerância com sucesso para a população que precisa do acesso à Justiça”, avaliou.

Também participaram da itinerância a defensora pública Thaís Lopes, os(as) servidores(as) Ana Carolina Mira, Alan Oliveira, Ana Carla Oliveira, João Almeida, José Fernando Martins, Marcos Silva Michele Abade, Tunísia Cores; o técnico de informática Rian Souza; os artífices Adriano Reis e Vagson Falcão; e os motoristas Marcos Jean e Cícero Brito.