COMUNICAÇÃO

Defensoria reafirma combate ao racismo religioso no II Encontro em Defesa dos Povos de Terreiro

31/10/2023 14:49 | Por Mirela Portugal DRT 6967/BA

Evento reuniu autoridades religiosas e atores do sistema de justiça para debater a defesa jurídica das religiões de matriz africana

“Para nós é uma grande alegria ter a oportunidade de estar dentro de um terreiro, que é um espaço sagrado, e fazer dessa presença, por si só, um ato pedagógico”. As palavras da defensora pública Vanessa Nunes marcaram a abertura do II Encontro em Defesa dos Povos de Terreiro, no tradicional Terreiro da Casa Branca, no Engenho Velho, em Salvador.

O evento, que reuniu na sexta e sábado (28) autoridades religiosas, representantes do sistema de justiça, ativistas e pesquisadores das religiões de matriz africana foi organizado por meio de parceria entre a Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (RENAFRO), a Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA), Defensoria Pública da União (DPU) e o terreiro carioca Ilê Omolu Oxum,  instituição que sediou a primeira edição do evento, no ano passado.

“Nosso papel é transmitir aos povos de terreiro que eles têm o direito de acessar o sistema de justiça. E, além da acolhida e da validação dos direitos, a gente atua nas demandas cíveis, temos estrutura para buscar indenização pelos atos de violência religiosa de cunho racial, indenização em ação civil pública, além do papel de fazer educação em direitos. Ou seja, há uma série de possibilidades de atuação da DPE/BA nessa causa”, afirma Vanessa Nunes, coordenadora do Núcleo de Equidade Racial da DPE/BA.

A defensora pública mediou uma das mesas de debate, a qual contou com exposição do professor e advogado Hédio Silva Junior,  doutor e mestre em Direito pela PUC-SP e defensor das religiões de matriz africana nos Tribunais Superiores. Em sua exposição, o especialista destacou a necessidade de fortalecimento no combate ao racismo religioso.”O discurso de ódio não pode ser vencedor. Precisamos nos fortalecer não apenas na mídia, mas também entre nós, para sermos sujeitos de transformações”.

Também estiveram presentes, ao longo da programação, defensoras e defensores públicas (os) de diferentes ramos institucionais da DPE/BA, como a defensora pública e diretora da Escola Superior da Defensoria Pública da Bahia (ESDEP), Diana Furtado, que participou da Mesa de Abertura do evento. As palestras também foram acompanhadas pela turma de defensores integrantes do XXX Curso de Formação, recém-empossados na DPE/BA após o 8º Concurso de Provas e Títulos.

Leia depoimentos sobre o II Encontro em Defesa dos Povos de Terreiro:

Vanessa Nunes, defensora pública e coordenadora do Núcleo de Equidade Racial da DPE/BA:
“Fico muito realizada e satisfeita em ver o trabalho acontecer. É uma luta cansativa, difícil e árdua para quem faz o enfrentamento ao racismo, mas a gente ver que existe um encaminhamento das questões, um amadurecimento dos debates, e ver que a gente não está sozinho , que tem uma rede de pessoas pensando soluções, isso fortalece muito a gente. Fica a esperança no nosso próprio trabalho, que tem o potencial de nos levar a uma condição de civilidade maior, com a defesa de direitos”.

Letícia Peçanha, defensora pública:
“O evento de hoje simboliza um compromisso da Defensoria Pública na defesa dos povos de terreiro.  Isso porque, nesse evento, não se pensa só na dimensão do racismo religioso, que é algo que os afeta muito. Mas se pensa também no aspecto da saúde, da educação, e de uma proposta de políticas públicas. É um modelo emancipatório diferente da perspectiva que normalmente se pensa, quando se pensa no povo de santo. Essa construção de trazer a RENAFRO, e demais órgãos do sistema de justiça e da sociedade civil, demonstrou que é necessária a união, e a DPE nesse momento se compromete com isso”.

Júlia Lordelo Travessa, defensora pública:
“Como defensora pública da área de família, da  vulnerabilidade feminina e da parte socioassistencial de saúde, eu entendo que os espaços de terreiro são extremamente qualificados para dar esse suporte que o poder público muitas vezes não está dando para as famílias, inclusive como parceiros da gente no processo de educação em direitos, de transmitir essas informações, de orientar quais canais ir. Mas, principalmente, a preservação desses espaços contribui não só para ser um local de referência para a população, mas também como espaço de construção da memória social. Quanto mais a DPE estiver em articulação com essa demanda, e atuando em cunho preventivo na proteção desses espaços, vamos ganhar como sociedade”. 

Diana Furtado, defensora pública:
“É muito importante para a Defensoria Pública participar desse esforço coletivo para garantia de direitos dos povos de terreiro, ainda mais quando esse esforço se materializa num encontro realizado dentro de um espaço que é patrimônio civilizatório para essas pessoas”.

Adriana Almeida Santos, Ebome de Oxalá, Filha de Santo do Terreiro da Casa Branca:
“Esse evento é um evento de grande importância, porque a gente precisa trazer órgãos que facilitem nossa comunicação, para encaminhar as demandas de terreiro, que são diárias. Assim, para nós é uma oportunidade, porque conseguimos atingir um coletivo de pessoas que podem nos ajudar”.

 Isaura Genoveva Neta, Ekedi do Terreiro da Casa Branca:
“Para nós, que somos do axé, estamos passando por um momento muito delicado de proteção do território. Eu também, como operadora do Direito, porque sou advogada, pesquisadora, e mestranda em Direito, esse momento de trazer o sistema de justiça para dentro da comunidade é a oportunidade de direcionar a atenção e o olhar para essas comunidades, que ao longo da diáspora africana sofrem com toda sorte de racismo. A Defensoria é a porta da comunidade, é quem garante socorro, atenção. É o nosso acesso à justiça. Por isso é fundamental a presença da DPE e da DPU, porque a Defensoria é a porta que a comunidade bate”.

Tatiana Almeida, do Terreiro Paz e Justiça, criadora de conteúdo para a internet no @macumbaonline:
“É fundamental reunirmos várias pessoas de várias casas para debater, porque terreiro é lugar de resistência, é o nosso quilombo. É onde a gente consegue manter nossa ancestralidade. Não é uma ação voltada apenas para o povo de matriz africana, mas para toda a sociedade”.

Lucas Azambuja, defensor público no XXX Curso de Formação:
“É um prestígio enorme participar de um evento como esse, porque a Defensoria é um instrumento de democracia, de emancipação, e não pode estar de olhos fechados para as necessidades dos povos de terreiro, que estão na resistência desde que o Brasil é Brasil. Temos de unir esforços para, cada vez mais, estarmos atentos às demandas desse povo, somando no que for possível dentro do mundo jurídico e extrajurídico, estando ao lado deles, que têm o protagonismo, para atuar em rede nesta luta”.