COMUNICAÇÃO

Com foco em problemáticas de grupos vulneráveis e em situação de rua, Defensoria lança sétima edição de sua Revista Jurídica

15/12/2022 12:39 | Por Júlio Reis – DRT/BA 3352

Publicação é o terceiro volume da série “Defensoria e minorias” e além de artigos, traz registros de experiência e estudo de caso como formas alternativas de apresentação e difusão de informações e saberes

Debates em torno de pessoas com deficiência, idosas, em sofrimento mental e em situação de rua compõem a 7ª edição da Revista Jurídica da Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA. Lançada na manhã desta quarta-feira (14) no auditório de sua Escola Superior – Esdep, a publicação é o terceiro volume da série “Defensoria e minorias” e reúne escritos que abordam aspectos legais e sociais destes temas.

Uma novidade do periódico, que tem o selo da Esdep, é que além de dez artigos, traz três registros de experiência e um estudo de caso como formas alternativas de apresentação e difusão de informações e saberes. Para o defensor público e diretor da Esdep, Clériston Macêdo, o conhecimento compartilhado também joga um papel importante na transformação da vida das pessoas e no aperfeiçoamento de práticas institucionais.

“Os textos são assinados não apenas por defensores, como por servidores, ex-estagiários, além de pessoas externas à instituição. Tocam questões do trabalho diário da Defensoria, temas e contextos com quem estamos umbilicalmente ligados. Avaliamos como fundamental dar publicidade e registrar, numa revista de uma Instituição do sistema de Justiça, todo este conhecimento, de natureza prática, empírica ou teórica que estará disponível ao público em geral pela internet”, comentou Clériston.

Relatos

Um dos relatos da revista é a experiência vanguardista e reconhecida da criação do Núcleo Pop Rua pela DPE/BA. Assinado pela defensora pública Fabiana Miranda, que esteve à frente do Núcleo entre 2018 e 2022, o artigo remonta marcos e êxitos da atuação do Núcleo, estabelecido institucionalmente em 2018, mas com antecedentes que remontam a experiências desde 2010.

“É o único Núcleo no país que atua multidisciplinarmente (com uma equipe defensores, assistentes sociais e psicólogos), atendendo especificamente o grupo vulnerabilizado de pessoas em situação de rua. Ele tem ramificações que passam desde o grupo itinerante, que atua diretamente com atendimento nas ruas, a grupo de estudo e ações de midiativismo, promovendo os direitos humanos e a educação destes. São um conjunto de iniciativas que buscam compreender e pensar meios para enfrentar a complexidade das violações de direitos humanos expressa na condição de viver nas ruas”, comentou Fabiana Miranda.

A defensora assina ainda outro relato, em coautoria com a psicóloga e servidora Patrícia Von Flach, sobre a experiência da equipe de Saúde Mental da DPE/BA desde sua implantação em 2019, com foco na defesa do direito ao cuidado em liberdade das pessoas que vivem situações de sofrimento mental. O terceiro relato fica por conta da defensora Manuela Passos que aborda a criminalização da pobreza por meio de experiências na defesa de pessoas em situação de rua quando julgadas no tribunal do Júri de Feira de Santana, comarca onde atua.

Artigos
Em coautoria com outros colegas de universidade, a ex-estagiária da Defensoria na área de Direito, Thamires dos Santos, assina artigo a partir de investigação realizada com pessoas em situação de rua em Salvador sobre como estas encaram e se relacionam com os guardas municipais da cidade.

“Os guardas municipais têm, entre outras atribuições, proteger bens e patrimônios. Ocorre que nesta proteção de bens na vida nas ruas, o dever de prezar pela vida e a dignidade humana fica em desvantagem. O artigo traz muitos relatos de agressões e violências contra estas pessoas que, por seu turno, compreendem que este tipo de atuação dos agentes públicos não está de acordo com suas missões”, destaca Thamires dos Santos.

Apontando o papel indispensável do registro de nascimento para acesso à cidadania, a servidora e analista jurídica da DPE/BA, Juliana Holanda do Outeiro, tematiza em artigo de sua autoria as inovações normativas e as excepcionalidades no acesso ao registro tardio por pessoas em situação de rua e pessoas com graves problemas de saúde mental.

“A lei prevê um prazo de 15 dias, que pode ser estendido até no máximo 60 dias, para se realizar o registro de nascimento. Após isso o registro é feito na modalidade tardia, disciplinado por normativa do CNJ, com exigências que vão variar de acordo com a situação das pessoas. Este é o caso das pessoas em situação e de rua e daquelas em sofrimento mental grave, cada qual com suas particularidades. Por outro lado, é preciso dizer que respeitado estes procedimentos, o registro tardio, desde 2008, pode ser realizado extrajudicialmente, o que busca facilitar já que antes o processo precisava ser judicializado”, discorre Juliana do Outeiro.

Já a servidora e assistente social do Núcleo Pop Rua, Sandra Carvalho, assina artigo sobre às enormes dificuldades de acesso à saúde pela população em situação de rua em contraste com o princípios de universalidade, integralidade e equidade previstos no texto Constitucional.

“Todos têm direito à saúde e, no entanto, a população em situação de rua não consegue acessar os serviços de saúde. É necessário debater as políticas públicas em torno desta população específica. Apesar do direito formalmente instituído, temos uma população que não é contemplada. Discutir este direitos, especialmente após a experiência do período de pandemia, é fundamental para se pensar estratégias de inclusão, de justiça social para as pessoas nesta situação”, destacou Sandra Carvalho.

Estudo de caso

Assistente social da DPE/BA, Zuldiane Coelho é autora de um estudo de caso que investiga a situação de uma mãe que perdeu a guarda de três filhos e hoje vive nas ruas. Negra, pobre e com moderado grau de sofrimento mental, a mulher acompanhada pela servidora do Núcleo Pop Rua é um retrato de dinâmicas que operam criminalizando a pobreza.

“Pouco antes da pandemia, ela veio de outro estado tentar se estabelecer em Salvador e sem rede de apoio acabou encontrando muitas dificuldades em todo este contexto. Pouco depois os filhos foram retirados sem justificativa plausível, já que não havia sinais de maus tratos, situações de violência ou de fome. Nosso objetivo é vir a garantir o direito a maternagem, que ela não perca sua família. Que as políticas públicas se organizem para garantir os direitos dessa mulher e pensando nestas especificidade dela, construir as saídas, sem imposições”, observa Zuldiane Coelho.

De acordo com Zuldiane, os filhos da mulher acompanhada estão hoje vivendo em instituições para estes fins. “O Estatuto da Criança e do Adolescente aponta que a pobreza não pode ser impeditivo para o exercício da maternidade. No entanto, diante do racismo estrutural e institucional, o que se vê são resoluções distintas. Exigem de famílias nesta situação, algo que não compõe e experiências delas”, acrescentou.

Da equipe da Defensoria também assinam textos a servidora Laíse Couto e a estagiária residente em Direito, Mônica Carneiro.