COMUNICAÇÃO

Aprender para ensinar: DPE/BA forma Defensoras Populares em estreia do projeto no Conjunto Penal Feminino

17/11/2023 14:10 | Por Mirela Portugal / DRT 6976/BA

Iniciado no dia 3 de outubro, o curso foi organizado em parceria da Escola Superior da Defensoria Pública do Estado da Bahia (ESDEP) com a Especializada Criminal e de Execução Penal e a especializada de Direitos Humanos

“Conhecer mais dos próprios direitos e aprender para ensinar as camaradas”. Esta foi a resposta mais repetida pelas alunas que, com o diploma em mãos, foram perguntadas sobre a parte mais marcante do curso de formação de Defensoras Populares, que chegou à sua aula de encerramento na última quinta-feira (16).

Pela primeira vez, o projeto da Defensoria do Estado da Bahia (DPE/BA), que capacita mulheres para atuarem em suas comunidades por meio da formação continuada em direitos, foi ministrado para as internas do Conjunto Penal Feminino, em Salvador. 

Com o tema “Autoestima, Empoderamento e Feminismo Negro”, a última aula ficou sob responsabilidade da Ouvidora Geral da DPE/BA, Naira Gomes, e da costureira, turbanteira e influenciadora social, Marcela Santos.  Trazer a beleza e o amor próprio foi fundamental em um curso ministrado majoritariamente por mulheres para mulheres, reafirmou Naira Gomes. “Trazer o toque, fazer tranças, ter esse momento aqui me emocionou muito. Foram muitas mulheres se voluntariando, doando cremes de cabelo e acessórios, dando aulas, para fazer o curso acontecer, além de trazer um pouco de luz e esperança para esse lugar. Saio muito satisfeita”, celebrou.

Há 9 meses interna no Conjunto Penal Feminino, em Salvador, Vanessa Dourado*, 21 anos, correu para ser a primeira a fazer maquiagem e ganhar um penteado na oficina de práticas estéticas. Para ela, a aula predileta ao longo do curso foi sobre direito de família, justamente por auxiliá-la em uma questão ligada às suas próprias vivências. “Gostei que ela falou de uma situação que ajuda o meu filho, pois o pai dele faleceu, e descobri que a avó dele pode dar também pensão a ele, e a avó não faz. Agora vou correr atrás disso”, conta. 

Fátima Soares*, 41 anos, está a um ano e 7 meses no Conjunto Penal Feminino e nos contou que o Curso de Formação a fez enxergar um caminho profissional não apenas para ela, mas para a filha dela, de 9 anos, que a aguarda do lado de fora junto ao outro filho de 17 anos (o companheiro não mais a espera, após tê-la abandonado durante o cárcere). “Depois desse contato com a Defensoria, eu penso, agora, em investir na minha filha fazer Direito. E eu mesma fiquei interessada na área de direito da criança, principalmente o Conselho Tutelar, para fazer vistoria na rua, ver realmente quem é mãe de verdade”, relata.

Para Vanessa Daniela*, de 21 anos, a memória mais vívida que ficará no curso será a empatia das organizadoras. “Foi uma coisa muito forte, vocês saírem do lado de lá para o lado de cá, e nos fazer pensar que não fomos esquecidas”. Outra aula que entrou na lista de preferidas foi a de execução penal. “Foi a aula com a Professora Larissa, aprendi muito sobre meu processo e sobre os nossos direitos aqui dentro, foi muito esclarecedor”, afirma.

Os conhecimentos jurídicos também mudaram a perspectiva de Cláudia Marta*, de 63 anos. “Gostei de tudo, tudo, mas o mais importante que eu achei foi conhecer meus direitos, o Código Penal, as leis, o que eu não sabia ou entendia. Não vivemos em um lugar muito fácil, mas foi um curso que senti prazer de vir, levantar, tomar meu banho e participar”, relata. Cláudia está no Conjunto Penal há 3 anos, após a gravação de um telefonema para o filho gerar um processo por associação para o tráfico. “Sou protestante, pretendo usar o que aprendi na minha comunidade e mostrar que tudo é possível ao que crê”. 

Educação em direitos

Iniciado em 3 de outubro, o curso de Defensoras Populares foi organizado pela Escola Superior da Defensoria Pública do Estado da Bahia (ESDEP), em parceria com a Coordenação Especializada Criminal e de Execução Penal, além da Coordenação de Direitos Humanos.

Para Diana Furtado, diretora da ESDEP,  essa edição do curso deixou um saldo de grande sensibilidade, especialmente a aula final, sobre autoestima e feminismo. “Tendo chegado ao final do curso, reafirmamos a certeza de que a Escola Superior tem muito a contribuir com a sociedade civil em educação em direitos. A aula final foi um momento de acolhimento e afeto”, comenta. “Nós fizemos um curso belíssimo e proporcionamos informação e empoderamento, essenciais à emancipação e à transformação da realidade dessas mulheres que estiveram conosco”, observa. 

Na visão de Larissa Guanaes, coordenadora da Especializada Criminal e de Execução Penal, todos abraçaram o projeto de forma gratificante. “Tivemos uma boa adesão até o final e as internas participaram de forma ativa, questionando e demonstrando interesse. Achei muito bonito quando as internas pegaram os certificados e falaram com orgulho: ‘Agora eu sou Defensora Popular! Me aguardem’. Espero que elas possam replicar o que ouviram e viveram no curso”, celebra a defensora pública. 

A professora da aula de encerramento, a costureira e turbanteira Marcela Santos, reforçou a importância de que a Defensoria Pública ocupe os espaços sociais mais necessitados, justamente, da presença da instituição. “Penso que, assim como essas, outras iniciativas deveriam adentrar aos portões da penitenciária, para abrir um novo leque, um novo olhar, e trazer outros saberes para esses lugares. Para mim foi um prazer compartilhar minha vivência com essas mulheres, minha biografia, e poder trazer outras possibilidades de caminhos para essas vidas”, afirma. 

*Os nomes utilizados são fictícios.