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Campo Formoso – Defensoria aponta irregularidades e consegue anulação de ato processual no sistema socioeducativo

A decisão reafirma os direitos dos adolescentes e estabelece o entendimento que o Código de Processo Penal deve ser utilizado de maneira subsidiária ao ECA
09/04/2025 04:04 | Por Ailton Sena
Campo Formoso – Defensoria aponta irregularidades e consegue anulação de ato processual no sistema socioeducativo

A Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA) conseguiu um precedente importante para a defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes no estado. A partir da identificação e denúncia de irregularidades processuais, a instituição conseguiu a anulação da audiência de apresentação em um processo socioeducativo que tramita em Campo Formoso, a 412,1 km de Salvador, no norte baiano. A decisão, obtida em segunda instância, reafirma os direitos dos adolescentes e garantiu que os jovens pudessem responder ao processo em liberdade.

Na audiência de apresentação, o objetivo é conhecer os(as) adolescentes e o contexto socioeconômico em que estão inseridos para compreender de que forma o sistema socioeducativo pode cuidar deles e contribuir com a proteção dos direitos dos adolescentes. “Isso acontece porque o processo socioeducativo não tem apenas caráter punitivo, mas também visa a integrar os adolescentes, a partir de diversas formas de intervenção”, explica a defensora pública Vitória Souza.

Contudo, no caso em questão, foi realizado um interrogatório indevido com os adolescentes. O procedimento deve acontecer apenas no segundo momento do processo e os jovens precisam ser informados sobre a possibilidade de ficar em silêncio. Antes, contudo, são ouvidas as testemunhas de defesa e de acusação. O adolescente fala por último. De acordo com a defensora Vitória Souza, a ordem dos depoimentos não está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é uma utilização subsidiária do Código de Processo Penal (CPP), que inclusive, foi referendada pelo Tribunal de Justiça.

“É inconteste que o interrogatório como último ato da instrução permite que o menor tenha conhecimento prévio de todas as provas e depoimentos produzidos contra ele, possibilitando o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, que, inclusive, pode ser exercido pelo silêncio, devendo, portanto, ser advertido desta garantia”, afirma a decisão. O texto reforça ainda ser “ilógico” imaginar que as garantias constitucionais previstas na Constituição Federal e no CPP “não possam ser aplicadas de forma irrestrita ao processamento dos atos infracionais, ou seja, em benefício dos menores infratores”.

Ao comentar a importância da decisão, a defensora Vitória Souza reiterou que os adolescentes devem ser vistos como sujeitos de direitos, inclusive de direitos processuais, como a ampla defesa e o contraditório. “A alguém que ainda está se desenvolvendo enquanto sujeito não pode ser oferecido tratamento mais gravoso que ao adulto. Assim, o papel da Defensoria Pública está em buscar assegurar os direitos dos adolescentes, observando, ainda, a existência de falhas estruturais familiares, da sociedade e do Estado, em oferecer qualidade de vida digna e alternativas de desenvolvimento”, afirmou.

Com a anulação da audiência de apresentação, o ato processual precisou ser refeito e, assim, o prazo máximo de internação provisória dos adolescentes também já havia sido extrapolado. Por isso, foi determinado que eles respondessem ao processo em liberdade e pudessem voltar a Campo Formoso. Por não existir unidades de atendimento socioeducativo no município, os adolescentes estavam internados provisoriamente em Salvador.