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Infraestrutura, acessibilidade e mobilidade são tema do Seminário sobre o Direito à Cidade a partir de Política Antirracista

Por Tunísia Cores - DRT/BA 5496

Evento foi realizado na tarde desta quarta-feira, com transmissão ao vivo nos canais do Facebook e Youtube da Defensoria Bahia

Infraestrutura urbana, mobilidade e acessibilidade foi o tema da terceira mesa do Seminário Direito à Cidade a partir de uma Política Antirracista, que teve início às 14h, e foi transmitido ao vivo no Youtube e no Facebook da Defensoria da Bahia. O encontro foi promovido pela Ouvidoria Cidadã da Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA e contou com a mediação de Marly Muritiba, representante do Coletivo Fórum Permanente de Itapuã- FPI e da Câmara Técnica do Conselho Gestor da Área de Proteção Ambiental Lagos e Dunas do Abaeté.

Coordenadora-adjunta do Grupo de Trabalho pela Igualdade Racial da Defensoria Pública do Estado da Bahia, Vanessa Nunes Lopes comentou sobre instrumentos jurídicos que versam sobre a igualdade racial, sobre como pensar a infraestrutura da cidade a partir destes instrumentos. Também trouxe provocações sobre o significado de infraestrutura e a necessidade de descolonizar a própria ideia de cidade por meio de políticas públicas capazes traduzir as necessidades e anseios da população.

“É preciso se apropriar de formas de vida da população em Salvador, pensar em terreiro como cidade, bloco afro como cidade, quilombo como cidade. Tudo isto nos diz que existem outros modelos possíveis de vida coletiva, associativa negra e vital, no sentido que nos permite viver com prazer, energia, construção e integralidade. A gente precisa recuperar o passado para pensar em como podemos nos organizar de forma diferente e produtiva para nós”, explicou a defensora pública.

Vanessa Nunes destacou ainda que discutir infraestrutura ultrapassa a discussão sobre transporte, saneamento e energia. “Quando discutimos infraestrutura, estamos pensando em direito à vida. Se há uma população majoritariamente negra, que está empobrecida, em trabalho informal, essa população não pode trabalhar em uma situação de pandemia. E não tem dinheiro para acessar transporte, o que impede o acesso a outros espaços. Tudo isto esta relacionado ao desdobramento na vida das pessoas”.

Professora de Arquitetura e Urbanismo, Glória Cecília Figueiredo discutiu a infraestrutura do ponto de vista da implantação do monotrilho no subúrbio ferroviário em substituição ao trem na região. Diariamente, destacou, mais de 10 mil pessoas utilizam o serviço. “A proposta apresentada de forma extremamente autoritária se coloca como uma imposição, no sentido de modernização do trem, mas, da forma em que está sendo conduzido, não é o desdobramento da escolha dos territórios”, afirmou.

A questão da tarifa é um ponto a ser destacado pela docente, uma vez que os usuários pagam uma tarifa simbólica e, com a mudança de modal – considerando com padrão a tarifa atual de transporte em Salvador –, diversas pessoas ficariam à margem do serviço. “Concretamente, essa população não tem condições de utilizar esse novo modal que o Governo do Estado está colocando. Não houve audiência pública junto à população, houve pequenas reuniões orientando o processo de indenização e desapropriação. Claro, precisamos de investimentos em infraestrutura e transporte, mas é fundamental que essa elaboração reconheça um território preexistente, sedimentado a duras penas, onde a população tem desenvolvidos estratégias de sobrevivência, que poderiam ser potencializadas nos processos de transformação”.

Administrador público e doutor em Arquitetura e Urbanismo, Daniel Caribé trouxe como referência o geógrafo Milton Santos, o qual divide a cidade economia urbana em dois grandes grupos. A maioria esta destinada a produzir sobre um regime extensivo de exploração, mas violento e opressor, outro grupo de trabalhadores é submetido a um sistema de exploração mais moderno, que lança mão de tecnologias mais atuais. “Essa não é apenas uma divisão do trabalho, mas também se expressa no espaço produzido socialmente, especialmente nas metrópoles brasileiras. Os trabalhadores são segregados a depender de quão agudas são as desigualdades”, comentou.

O advogado, arquiteto e urbanista Marcos Alan Brito destacou que há a ineficácia de leis que deveriam assegurar o acesso à infraestrutura e aos espaços sociais da cidade. “A lei acaba sendo simbólica, serve para dizer que existe, mas não dá realmente o direito a todos e serve apenas a um segmento, a uma elite”, afirmou brito, que é o membro do Núcleo de Advogados Negros.

Marcos Alan destacou as diferenças de tratamentos urbanísticos em bairros diversos de Salvador e relembrou que a sociedade foi construída a partir da ideia de propriedade e não no bem-estar social. “Isto é extremamente preocupante porque verificamos que existe, na verdade, um capitalista profundo que exclui. E a própria construção da sociedade brasileira, escravagista, cria a segregação que há hoje”, explicou.

Também ativista do Coletivo de Entidades Negras, Marcos Alan comentou sobre os caminhos para ampliar e representação da população negra nos espaços e também promover a participação mais direta nas esferas decisórias. “Só a mobilização da população pode trazer mudanças, seja individualmente ou por meio dos movimentos sociais. Para termos a eficácia dos nossos direitos, devemos buscá-los exigindo judicialmente os nossos direitos, e a Defensoria é um espaço onde a população pode buscar auxílio individual e coletivos, dentro dos moldes da Instituição, e também por meio da construção de leis, atuando no campo político para que a implementação dos direitos sejam efetivados”, finalizou.

A arquiteta e urbanista Islândia Costa, membro da Coordenação da Associação Vida Brasil, trouxe conceitos de mobilidade e acessibilidade, destacando que a cidade deve estar ao alcance de todas as pessoas. A acessibilidade, segundo pontuou, tem conexão direta com direitos fundamentais, sendo importante considerar questões de interseccionalidade, tais como gênero, raça, classe, orientação sexual, idade, entre outros pontos, os quais levam a experiências diversificadas nos espaços.

Coordenadora Estadual dos Agentes da Pastoral Negros do Brasil/BA, Alaíde Santana trouxe referências sobre a função social da cidade, apresentou dispositivos constitucionais que versam sobre o tema e comentou sobre a relação com o bem-estar da população. Neste ponto, refletiu sobre o Plano Diretor Urbano de Salvador, o qual destaca que a função social da cidade corresponde à terra urbanizada, moradia, saneamento básico, segurança, infraestrutura, serviços públicos, saúde, trabalho, lazer, entre outros.

“O que dizer da infraestrutura de Salvador? É como se os negros fossem invisibilizados. Deveria haver uma equidade nos direitos, há leis muito bem escritas, mas não encontramos a implementação dessas leis. Existem linhas invisíveis que impedem o transitar e o sentimento de pertencimento a essa cidade. O que falta as políticas e processos, o que nos apresenta é que nós continuamos estrangeiros dentro da nossa cidade, do pais em que nascemos e vivemos”, finalizou.