COMUNICAÇÃO

Teste de calha na hidrelétrica Pedra do Cavalo é adiado após Defensoria solicitar esclarecimentos ao Inema e ao Grupo Votorantim

04/08/2020 11:03 | Por Tunísia Cores - DRT/BA 5496 | Foto: reprodução

DPE/BA também solicita esclarecimentos sobre a regularização da licença de operação da respectiva usina hidrelétrica

O teste de calha que seria realizado nesta terça-feira, 4, na usina hidrelétrica Pedra do Cavalo, localizada nos municípios de São Félix e Cachoeira, foi adiado após a Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA solicitar ao Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – Inema e ao Grupo Votorantim a suspensão do evento por conta da não realização da consulta pública junto às comunidades locais.

Realizada por meio de ofício, a solicitação da DPE/BA incluiu ainda esclarecimentos sobre a regularização da licença de operação da respectiva usina. A ação foi realizada de forma conjunta com a Defensoria Pública da União – DPU na Bahia.

Prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a consulta pública foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto 5.051, de 2004, e consolidada por meio do Decreto 10.088, de 2019. Com isto, há determinação sobre a necessidade de consulta prévia, livre e informada dos povos interessados, por meio de procedimentos apropriados, toda vez que sejam previstas medidas legislativas e administrativas capazes de afetá-los diretamente.

“Trata-se de importante mudança legislativa, no sentido de reconhecer a essas comunidades o direito de assumir o controle de suas próprias instituições e formas de vida, mantendo e fortalecendo suas identidades, línguas e religiões dentro do âmbito dos Estados em que moram”, explica no ofício a Defensoria.

O documento foi elaborado pela Especializada de Direitos Humanos da Instituição, por meio das coordenadoras Eva Rodrigues e Lívia Almeida, assim como pelo defensor público Maurício Moitinho, que atua na Defensoria situada em Feira de Santana.

“A consulta reforça a liberdade expressiva das minorias, pois permite que, antes de iniciado qualquer processo decisório, as partes envolvidas se coloquem em uma posição de igualdade e dialoguem acerca da revisão do projeto inicial ou mesmo da sua não realização”, destacaram os defensores públicos no documento.

A Defensoria Pública do Estado da Bahia oficiou ainda o Instituto Chico Mendes tanto para obter mais Informações a respeito da licença ambiental da usina hidrelétrica Pedra do Cavalo quanto para verificar se o Grupo Votorantim de fato atua sem autorização e, em caso positivo, desde qual período. A previsão é que a resposta seja fornecida em até 48 horas.

Respostas

Em resposta, o Inema apresentou a Nota Técnica nº 03/2020 – Comon/Cocep que trata do comportamento do nível da Barragem de Pedra do Cavalo. A nota recomendou a realização do teste de calha com uma duração em torno de 10 horas, e de modo a incorporar a preia-mar (nível máximo de uma maré cheia). Também foi recomendado o teste “modelando uma vazão de 1.500 m/s e um volume de 40 hm3, ou fazer uma simulação de calha liberando 30 hm3 com uma vazão máxima em torno de 1.300m/s”.

Já o Grupo Votorantim, por meio da empresa Votorantim Energia, destacou na resposta a solicitação do Inema para verificar a capacidade de calha do rio Paraguaçu e também a prorrogação do teste para o dia 17 de agosto, “por se entender ‘sobre a necessidade do Estado em resguardar, informar e educar as comunidades locais, no intuito de desmistificar o receio sobre uma operação que visa a própria segurança dos habitantes’”.

A Votorantim Energia acrescentou que avaliará a existência de alternativas técnicas, bem como adotará medidas para divulgação ampla do evento, além de pretender contar com a colaboração conjunta das autoridades públicas locais, com o objetivo de adotar medidas de controle e segurança adequados. Por fim, a empresa informou que o processo de renovação da licença de operação da Usina Hidrelétrica de Pedra do Cavalo está em andamento junto ao órgão ambiental e que não há pendências, até o momento, pela empresa.

O defensor público da Bahia, Maurício Moitinho, analisa a realização do evento. “O modo como o teste de calha está programado para ser realizado, além de desrespeitar direitos das comunidades ribeirinhas que sobrevivem da pesca e da atividade marisqueira, pode causar graves danos ambientais, pois a hidroelétrica opera sem a licença de operação desde 2009. Em razão disso, não há certeza de que suas atividades sejam desempenhadas sem risco para a economia e ambiente públicos”, comentou.

Maurício Moitinho destaca ainda que, embora a usina hidrelétrica de Pedra do Cavalo esteja situada na região de São Félix e Cachoeira, o teste de calha trará impactos também sobre a região de Feira de Santana. Isto porque o lago Pedra do Cavalo banha, na localidade, as comunidades Brava, Amarela, Mergulho, Santa Luzia e Bom Jardim, no distrito João Durval Carneiro.

Entenda o caso

Por meio de uma Carta Aberta elaborada pelos pescadores, extrativistas e remanescentes de quilombo e endereçada à Defensoria Pública da União, a DPE/BA tomou conhecimento que o Grupo Votorantim promoverá a abertura das comportas da Barragem de Pedra do Cavalo com a autorização do Inema. O objetivo é a realização de testes de calha – uma operação para analisar o controle e a segurança do empreendimento – que estava prevista para às 9h desta terça-feira, 4.

Para a realização do teste, o Grupo Votorantim recomendou a suspensão das atividades pesqueiras na data, bem como a retirada das embarcações e de apetrechos de pesca do Rio Paraguaçu e da Baía do Iguape. O anúncio foi recebido com surpresa pela comunidade beneficiária da Reserva Extrativista do Iguape, uma vez que esta tomou conhecimento por meio de reportagens em sites de notícias.

A Defensoria Pública do estado da Bahia ressaltou no ofício que a medida, imposta pela intervenção do Grupo Votorantim, não foi discutida junto à comunidade e, consequentemente, não foi avisada com a devida antecedência. Além disso, os habitantes temem que haja prejuízos permanentes.

“A paralisação das atividades pesqueiras, por tempo indeterminado, causará prejuízos materiais imediatos para milhares de famílias de pescadores, extrativistas e quilombolas que habitam a Reserva Extrativista do Iguape. Além disso, há o temor de que os danos se perpetuem no tempo, de modo a agravar ainda mais a situação financeira destes indivíduos, que sobrevivem diretamente da pesca artesanal”, argumentou a Instituição.

Por fim, a Defensoria da Bahia destacou que a barragem de Pedra do Cavalo é objeto de investigação do Ministério Público Estadual, após denúncias de atuação com licença de operação vencida pelo Grupo Votorantim. Em razão disso, e pelo fato de a usina hidrelétrica da Barragem encontrar-se numa área de proteção ambiental, em 2016, o MP chegou a recomendar a interdição da usina.